quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

A ROMA DO GLADIADOR - V

A ROMA DO GLADIADOR – FICÇÃO E HISTÓRIA - V
COMODUS – À SOMBRA DO PAI

Até que ponto as faltas de um filho são as falhas de um pai?
Busto do verdadeiro Imperador Comodus
 O Filho do Imperador

"Gladiador” apresenta Comodus como um jovem que não vê a hora de ser nomeado sucessor de seu pai, que mal pode esperar para exercer o poder e fazer dele um uso que, acredita, deveria ser feito por seu pai. 
Mas, como já foi dito no texto anterior desta série, ele não matou Marcus Aurelius e já era co-Imperador quando seu pai morreu.
Fica patente, desde o início, o desprezo que sente pela instituição do Senado, e que não reconhece nos senadores os intermediários entre o Imperador e o povo de Roma.
Demonstrando o histórico gosto de Comodus pelos espetáculos, o filme o apresenta, logo no início, planejando jogos e sacrifícios em honra do pai, não ficando claro se com isso rendia realmente homenagens a Aurelius ou se satisfazia os próprios desejos, uma vez que o próprio pai rejeita o sacrifício dos touros que o filho lhe oferece e lhe conclama a honrar Maximus, o verdadeiro vitorioso sobre os germanos.
Sim, Comodus lutava na arena. Mas fazia isso dentro de estritas normas de segurança pessoal, considerando que seus oponentes não receberiam armas reais e dificilmente algum gladiador teria ímpetos de matar o Imperador de quem poderia receber a liberdade e boas recompensas.
O Governo
O filme nos faz imaginar que Comodus teve uma passagem relâmpago pelo poder, que na realidade durou 12 longos anos.
Porém, Ridley Scott apresenta um imperador bastante convincente, muito bem interpretado pelo jovem ator Joaquin Phoenix, que alterna momentos de uma energia furiosa com fragilidade, típicas da idade e da pressão de assumir tão imensa responsabilidade ainda muito jovem.
Mas o roteiro corteja perigosamente o ridículo ao mostrar o Imperador de Roma reconhecendo que tem medo do escuro.
O filme está correto quando demonstra, logo no início do reinado, os problemas do jovem imperador com o Senado e sua irmã, mas não encontramos qualquer indício de que Comodus nutrisse uma paixão incestuosa por Lucila. 
O que se sabe é que ela esteve envolvida na primeira conspiração para matá-lo, no que fracassou e acabou sendo exilada e, depois, executada.
Também é pouco provável a cena que mostra o imperador armado dentro do Senado e uma mulher, no caso sua irmã Lucila, participando da sessão e intervindo nos debates.
Os Jogos
No filme, conforme prometera fazer, Comodus abre uma grande temporada de jogos no Coliseu. Ele justifica sua decisão com duas motivações: uma pública, homenagear o pai; e outra privada, conquistar o povo dando-lhe uma visão da glória de Roma através das lutas no Coliseu, já que a população apenas ouve falar das glórias romanas conquistadas nos campos de batalha, pelas legiões.

Organizar estes jogos custava muito caro aos cofres romanos, e o filme explica que os estoques de cereais estavam sendo vendidos para pagá-los, o que ocasionaria uma temporada de fome mais à frente.
Isso, segundo o filme, justificaria o golpe planejado pelo Senado e por Lucila contra seu irmão. Na verdade, Comodus usava os impostos do Senado para pagar pelos jogos, por isso era bastante impopular entre os ricos, mas popular entre os pobres!
Seu reinado também foi, por paradoxal que pareça, um período de descanso para os cristãos, contra quem as perseguições do império diminuíram bastante!
Enfim, pode-se até dizer que Comodus foi morto por conta das lutas de gladiadores, mas não participando de uma delas.
Seu fim veio por meio de outra conspiração, que envolveu sua amante Márcia e altos personagens do império, auxiliares próximos do Imperador.
A amante de Comodus pediu ao gladiador Narciso que o matasse, o que este fez estrangulando-o durante o banho.
Ou seja, sua morte veio pelas mãos de um gladiador, mas o campo de batalha foi uma banheira, e não as areias do Coliseu.
Continua...

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1 GIBBON, Edward. Declínio e queda do Império Romano. Tradução e notas suplementares de José Paulo Paes. Editora: COMPANHIA DAS LETRAS. São Paulo, 1980.
2 ROSTOVTZEFF, M. História de Roma. Rio de Janeiro; Zahar Editores, 1961.
3 LENDERING, Jona. Legio IIII Flavia Felix. Disp. em http://www.livius.org/le-lh/legio/iiii_flavia_felix.html - Cap. em 14/09/15

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