segunda-feira, 10 de julho de 2017

A MORTE DE NICOLAU II

A MORTE DE NICOLAU II
Em um dia 17/07, no ano de 1918, Nikolái Alieksándrovich Románov, o último Csar da Rússia foi assassinado, juntamente com toda sua família, na cidade de Ecaterimburgo, fuzilado pelos soldados do governo Bolchevique.
Nicolai teve a má sorte de ser um homem de mente atrasada, à frente de um país atrasado, mas no seio do qual crescia o embrião da revolta em um tempo de virada da História.
Nicolai nasceu em 18/05/1868 em Tsarskoye Selo, em um dos palácios da família imperial russa, perto da capital, São Petesburgo. Era filho do Csar Alexandre III e de Maria Feodorovna ou princesa Dagmar da Dinamarca, então Csarina Consorte da Rússia.
Aos 13 anos Nicolai se tornou herdeiro direto do trono por conta do assassinato de seu avô, o Csar Alexandre II e a coroação do pai. O garoto então se mudou para o Palácio de Gatchina, fora da capital, por questões de segurança.
Sua educação foi rigorosa, dormia em um quarto sem luxo, de modo a aprimorar sua resistência, aprendeu francês, alemão, inglês, História, geografia, dança, etc. Seu tutor incutia-lhe sempre que possível, a importância do exercício do poder absoluto.
Em 1894 Nicolai ficou noivo de Alice de Hesse-Darmstadt contra a vontade de seus pais pois a moça era de origem alemã, contudo, quando Alexandre II adoeceu e sua morte tornou-se iminente, a autorização para o noivado foi dada. O Csar faleceu antes do casamento ser realizado. Após a cerimônia Alice passou a se chamar Alexandra Feodorovna, Csarina Consorte da Rússia.
Nicolai e Alexandra.
O pai de Nicolai providenciou para que fosse rigorosamente educado, mas não lhe preparou para os deveres de Csar e o pouco treinamento de Nicolai nessa área veio por insistência do Ministro das Finanças Serguei Witte. A despeito disso, quando chegou o momento, o próprio Nicolai reconheceu seu despreparo.
A Coroação de Nicolai II.
Alexandre III mergulhara de vez a Rússia no atraso ao revogar quase todas as reformas feitas por seu pai, Alexandre II, dentre elas a proibição de acesso às universidades para os russos que não tivessem origem nobre![1]
Claro que tal nível de repressão não poderia ser mantido senão pela força bruta da última monarquia absolutista da Europa onde até mesmo os divórcios deveriam ser aprovados pelo Csar![2]
Assim, o poder de Nicolai ao assumir o trono do país mais atrasado da Europa[3] estava baseado em um tripé de frágil equilíbrio formado pela burocracia, o grande e fraco exército e a polícia, chamada Okbrana.[4]
Os problemas começaram já nas festividades do casamento, quando uma festa preparada para o povo acabou em tumulto e mais de 1400 mortes, ficando conhecida como Tragédia de Khodynka.
Vítima da Tragédia de Khodynka.
No governo Nicolai se mostrou muito cioso de seu próprio poder absoluto e, ao mesmo tempo, relutante em usá-lo, passando a impressão de fraco e indeciso.
Marcam o período os ataques a judeus, estimulados por propaganda negativa financiada pelo Ministro do Interior e a Guerra Russo-Japonesa na qual a Rússia foi derrotada pelo Japão, perdendo duas frotas navais. A guerra terminou em 1905, contudo, antes mesmo de seu fim, começariam as revoltas que levariam ao fim da monarquia alguns anos depois.
No dia 21/01/1905 foi anunciada uma marcha pacífica pelas ruas de São Petesburgo. O organizador, Padre Gapon, solicitou a presença do Csar para receber uma petição do povo. Mas os ministros não avisaram ao monarca e, ao invés disso, convocaram mais tropas para impedir as pessoas de chegar ao Palácio de Inverno.
Em 22/01/1905 a marcha foi iniciada e a cada momento recebia o acréscimo de mais e mais pessoas que caminhavam sob o frio e a neve cantando hinos religiosos e o Hino Imperial "Deus salve o Csar".
Em outras palavras, as pessoas acreditavam que o Csar as receberia como um pai e acolheria suas súplicas. Mas ao se aproximarem do Palácio encontraram os bloqueios de soldados que abriram fogo contra a multidão. O saldo foi de 92 mortos e muitos feridos, número que os boatos que chegavam ao interior do país era muitas vezes multiplicado. O divórcio entre o povo e seu Csar estava consumado.
A pressão interna e externa foi tamanha que Nicolai aceitou a convocação de um parlamento, chamado Duma, e a nomeação de um Primeiro Ministro, escolhendo Serguei Witte para o posto. Mas o Csar não pretendia abrir mão do próprio poder, de modo que logo entrou em confronto com os congressistas e a Duma foi dissolvida.
Nicolai e Alexandra na instalação da Duma.
A segunda Duma passou a funcionar em 1907 com Piotr Stolypin como Primeiro Ministro, o qual se encarregou de dissolver este segundo parlamento tão logo teve oportunidade, com apoio do Csar.
A terceira Duma foi mais prudente e deixou de atacar diretamente o governo, passando a se concentrar em questões econômicas conseguindo alguns avanços apesar da oposição de grande parte da nobreza ao trabalho de Stolypin e da Duma que eles classificavam como usurpação ao poder do Csar.
Mas não foi essa oposição que prejudicou Stolypin, foi o ódio que a Imperatriz Alexandra lhe devotava por conta da oposição deste à presença do Monge Rasputin na corte. Nicolai e Alexandra tiveram cinco crianças, sendo as quatro primeiras mulheres (Olga, Tatiana, Maria e Anastásia) e um filho, Alexei, o sonhado herdeiro do trono.
Nicolai II e família.
Mas Alexei tinha a doença real, hemofilia, e por isso inspirava cuidados redobrados. Nas crises, porém, somente Rasputin alcançara algum sucesso no restabelecimento do príncipe herdeiro, de modo que Alexandra, e o próprio Csar, não queriam prescindir da presença do Monge que, obviamente, tirava proveito desse favorecimento, de onde surgiram boatos de que influenciava o Csar em suas decisões de governo.
Em 1912, com o início da quarta Duma, esses rumores encontraram eco até mesmo entre defensores da monarquia.
A despeito de tudo, porém, a população uniu-se em torno do Csar quando a Primeira Guerra Mundial começou. Esse apoio porém só durou até que as ações do exército se tornassem uma série catastrófica de derrotas que resultaram em 215 mil baixas somente em 1914.
A derrota russa em Tannenberg.
Mas, em 1917 a situação das forças armadas era muito pior, pois “No início de 1917, o exército russo tinha perdido 2,7 milhões de homens, mortos ou feridos, e mais de 4 milhões de prisioneiros.[5]. A desilusão com os rumos da guerra exauriu o apoio a ela entre os próprios soldados.
E, no caso específico do fracasso militar, a imagem do Csar não escapou incólume, pois Nicolau II “...insistiu em assumir pessoalmente o comando do exército em 1915, isolando-se [...] ao se mudar para o quartel general longe da capital.[6].
O desabastecimento se instalou entre os anos de 1916-1917 quando “Por causa do rigor invernal, que aumenta as dificuldades de transporte, as reservas de farinha na capital estavam quase escotadas. Em fins de fevereiro o governo se viu obrigado a estabelecer um estrito racionamento e as padarias se viram incapazes de trocar todos os cupons.[7].

E se na própria capital a situação era esta,  no campo o quadro era ainda pior, de modo que as penúrias econômicas também influíram decisivamente nos eventos que se desencadearam logo a seguir.
Quando a falta de carvão obrigou o fechamento de fábricas que, por sua vez, iniciaram demissões em massa, gigantescas manifestações eclodiram no país: “...em Petrogrado, 150 mil trabalhadores entraram em greve. Um grande número de manifestantes também tomou as ruas em Moscou [...] Carcóvia e Baku.[8].
As manifestações foram se agigantando até 09 de Março, quando “... ocorreram os primeiros choques entre os grevistas e a polícia.[9]. E, a partir da adesão dos socialistas às manifestações dos trabalhadores, estas deixaram de ser contra a incompetência “...dos serviços administrativos, […] mas atacavam o regime político.[10].
O governo ordenou às tropas que atirassem na multidão. Desta vez, contudo, havia muitos soldados apoiando o povo. As tropas sediadas em Petrogrado “onde o grosso dos efetivos era formado por reservistas sensíveis à propaganda dos militantes, paralisou a resistência dos poderes públicos.[11]. Sem suporte militar, o regime desmoronou. 
Poucos dias depois, Nicolau II abdicou:
Nestes dias decisivos na vida da Rússia, consideramos nosso dever fazer o que pudermos para ajudar nosso povo a se unir e juntar todas as forças para a [...] vitória. Por essa razão, nós, de acordo com a Duma de Estado, consideramos melhor abdicar do trono...[12]
Nicolau II tentou emplacar seu irmão Miguel no trono, mas este se recusou a assumir, de modo que foi instalado um governo provisório de orientação liberal, sob comando do Príncipe Georgy Lvov e Alexander Kerenski no Ministério da Guerra.
Nicolai foi preso junto com toda sua família e assim ficou enquanto a Rússia seguia em convulsão. Quando os bolcheviques assumiram o poder a situação da família imperial começou a declinar até que veio a ordem de Lênin e Sverdlov para a execução que ocorreu em Ecaterimburgo na noite de 16 para 17 de julho.
Reunião do Soviet de Petrogrado.
Soldados armados entraram no quarto onde estava a família e começaram a atirar. Nicolai morreu primeiro, alvejado muitas vezes e suas filhas morreram por último, a golpes de baioneta. Também morreram neste dia o médico, o cozinheiro, o criado e a empregada da família.
Os restos mortais dos Romanov permaneceram sepultados em Ecaterimburgo até 1998, quando foram desenterrados em parte. Em 2008 foram encontrados os restos de Alexei e de uma de suas irmãs. Neste mesmo ano a Suprema Corte Russa reabilitou suas figuras, reconhecendo terem sido vítimas de repressão política.

[1]    CARTER, Miranda. Os Três Imperadores. Três primos, três impérios e o caminho para a Primeira Guerra Mundial. Trad. Clóvis Marques. Rio de Janeiro, Objetiva, 2013. pg. 69
[2]    Ibid. pg. 61
[3]    SONDHAUS, Lawrence. A Primeira Guerra Mundial – História Completa. Trad. Roberto Cataldo. Editora Contexto, 2011. pg. 25.
[4]    RODRIGUES, Luiz César B. A Primeira Guerra Mundial – Discutindo a História. São Paulo, Atual, 1994. pg. 26
[5]    SONDHAUS, Lawrence. A Primeira Guerra Mundial – História Completa. Trad. Roberto Cataldo. Editora Contexto, 2011. pg. 318.
[6]    PIMLOTT, John. A Primeira Guerra Mundial. Bogotá, Colômbia: Editora Norma. pg. 26.
[7]    RENOUVIN, Pierra. La Primera Guerra Mundial. Em língua espanhola. Trad. Jordi García Jacas. Barcelona-Espanha, Editora Montserrat, 1990. pg. 30. Tradução Livre.
[8]    SONDHAUS, Lawrence. A Primeira Guerra Mundial – História Completa. Trad. Roberto Cataldo. Editora Contexto, 2011. pg. 317.
[9]    RENOUVIN, Pierra. La Primera Guerra Mundial. Em língua espanhola. Trad. Jordi García Jacas. Barcelona-Espanha, Editora Montserrat, 1990. pg. 30. Tradução Livre.
[10]    Ibid pg. 30.
[11]    Ibid pg. 30.
[12]      Fonte: Documents of Russian History, 1914-1917, ed. Frank Alfred Golder (New York: The Century Co., 1927), 297-99. Mencionado em: SONDHAUS, Lawrence. A Primeira Guerra Mundial – História Completa. Trad. Roberto Cataldo. Editora Contexto, 2011. pg. 317.  

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Fontes e Imagens:
CARTER, Miranda. Os Três Imperadores. Três primos, três impérios e o caminho para a Primeira Guerra Mundial. Trad. Clóvis Marques. Rio de Janeiro, Objetiva, 2013.. pg. 69
SONDHAUS, Lawrence. A Primeira Guerra Mundial – História Completa. Trad. Roberto Cataldo. Editora Contexto, 2011. pg. 25.
RODRIGUES, Luiz César B. A Primeira Guerra Mundial – Discutindo a História. São Paulo, Atual, 1994. pg. 26
PIMLOTT, John. A Primeira Guerra Mundial. Bogotá, Colômbia: Editora Norma. pg. 26.
RENOUVIN, Pierra. La Primera Guerra Mundial. Em língua espanhola. Trad. Jordi García Jacas. Barcelona-Espanha, Editora Montserrat, 1990. pg. 30. Tradução Livre.
http://educacao.uol.com.br/biografias/klick/0,5387,1755-biografia-9,00.jhtm
http://www.grupoescolar.com/pesquisa/czar-nicolau-ii.html
http://escola.britannica.com.br/levels/fundamental/article/Nicolau-II/482045
https://seuhistory.com/biografias/nicolau-ii
https://www.ebiografia.com/nicolau_ii/
http://www.suapesquisa.com/quemfoi/czar_nicolau_II.htm
https://pt.wikipedia.org/wiki/Maria_Feodorovna_(Dagmar_da_Dinamarca)
https://pt.wikipedia.org/wiki/Alexandra_Feodorovna
https://pt.wikipedia.org/wiki/Guerra_Russo-Japonesa
https://pt.wikipedia.org/wiki/Batalha_de_Tsushima
https://pt.wikipedia.org/wiki/Domingo_Sangrento_(1905)
https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Russian_Revolution_of_1905
https://en.wikipedia.org/wiki/Russian_Revolution
https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Battle_of_Tannenberg_(1914)

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