sexta-feira, 11 de outubro de 2019

CORINGA – UM NOVO PARADIGMA DE ATUAÇÃO


Eis que, contra minhas expectativas, volto a escrever sobre um filme pouco tempo depois de IT – Parte II.
Mas era inevitável, considerando nosso critério de só escrever sobre filmes realmente marcantes. E Coringa é um filme absolutamente marcante, chocante, triste, que obriga a reflexão.
Coringa é um filme de origem que não traz novidade neste aspecto, trata-se de um comediante fracassado, tema que já tinha sido levantado em A Piada Mortal, uma das melhores revistas em quadrinhos de todos os tempos.
A relação criada com a origem do Batman é uma novidade, embora já tenha sido feito algo semelhante no primeiro filme do Homem Morcego com Michael Keaton, de 1989.
Coringa inova ao ser uma crítica à sociedade de consumo e do individualismo, que torna o outro invisível, enquanto não está dentro do círculo de interesses dos que o cercam.
Ninguém está lá, nunca, quando Arthur mais precisa, ninguém liga, ninguém oferece a mão, ninguém parece estar minimamente preocupado. E este é, assustadoramente, um retrato fiel do mundo em que vivemos, inclusive no Brasil.
Mas esqueça tudo isso, pois tudo isso é absolutamente ofuscado pela atuação indescritível de Joachim Phoenix. Não me lembro de ter visto nada mais soberbo.
A angústia e o sofrimento do personagem escorrem pela tela e nos pegam pelo pescoço, aperta, sufoca. O abismo da solidão de Arthur, o protótipo pronto e acabado do Looser (perdedor) como os estadunidenses concebem, é palpável em cada respiração, cada gesto e cada olhar de Phoenix.
O ator merece o Oscar e todos os demais prêmios de interpretação existentes em cada segundo de atuação. Como pode uma gargalhada transmitir   sofrimento? É simplesmente de partir o coração.
E a sua transformação? É uma libertação das amarras sociais, dos sistemas de pesos e contrapesos, representados pelas convenções sociais e pela lei, que é também o mergulho na psicopatia. Ele fez sua escolha. E obviamente escolheu errado.
Este momento é como se ele simplesmente desistisse de nadar e afundasse, mas não parasse de respirar. Ele se descobre um peixe, um tubarão com todas as demais pessoas sendo reveladas como presas potenciais.
Mas se nada disso tivesse ocorrido, ele ainda mereceria o Oscar e demais prêmios apenas pelo olhar que dirige para o personagem de Robert De Niro, pois ali não vemos mais Arthur. A nosso ver, ali já está o Coringa, plenamente estabelecido e dominante naquela personalidade perturbada.
E é ali que, também a nosso ver, o Coringa de Phoenix se encontra com o Coringa de Heath Ledger. Não é só na caracterização física, bastante semelhante, mas nas concepções de mundo. 
Em outras palavras, podemos ver que o Coringa de Phoenix vai ser o Coringa de Ledger no futuro, após anos de crimes, quando, então, vai conhecer e se defrontar com seu histórico inimigo, o Batman, então um homem adulto.
Joachim Phoenix estabelece um novo paradigma, paralelo ao estabelecido por Heath Ledger, com quem empata, a nosso ver. Ninguém mais, nos próximos séculos, poderá interpretar o personagem sem ser comparado com ambos, e perder. 
O mais icônico dos vilões da DC, que parecia fadado a fracassos como o de Jared Leto, ganha um novo intérprete definitivo, a altura do saudoso Heath Ledger. Que venha o próximo confronto com o Batman. Se a DC não estragar tudo, como parece ser sua prática recorrente.

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