O GUIA PARA O PARAÍSO
Os egípcios não separavam a religião da vida
cotidiana e já vimos que possuíam divindades relacionadas às mais diversas
atividades que impregnavam praticamente todos os aspectos do dia a dia das
pessoas, desde o Faraó até os camponeses.
Dentre todos os aspectos dessa vida impregnada
de religiosidade, o que mais parecia preocupar os egípcios era a morte. Ou,
melhor dizendo, garantir que houvesse uma vida após a morte por meio da
aprovação no Tribunal de Osiris.
O Tribunal de Osiris - a Pesagem do Coração e a apresentação da alma a Osíris conduzida pelos deuses.
|
Eles escreviam as fórmulas relacionadas ao
julgamento dos mortos nas pirâmides e nos sarcófagos há muito tempo. Durante o
Império Novo, porém, elas passaram a ser escritas em rolos de papiro que eram
colocados em vasos que ficavam próximos ao sarcófago, dentro da câmara, ou, em
contado direto com o corpo, junto às pernas da múmia, sendo enfaixados junto
com esta. Nascia, assim, o Livro dos Mortos baseado, acredita-se, nos Textos
das Pirâmides1 e
nos Textos dos Sarcófagos2.
Segundo Stuart Tyson Smith, Phd,
Professor da Univeristy of California Santa Barbara, falando no documentário
"O Livro dos Mortos" (do History Channel, produzido por Tim Evans e
dirigido por Petra Hafner), a obra "era um guia dos que morriam e tinha
instruções que ajudavam o morto em sua jornada, além do processo de tornar-se
imortal".
Para Zahi Hawass, à época Chefe do
Conselho Supremo de Antiguidades a obra “...fala o que eles encontrarão no
Além.”
Exemplar do texto das pirâmides. |
Exemplar do texto dos sarcófagos.
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Inicialmente destinado apenas às famílias
reais, nos reinados de Hatshepsut e Thutmés III tornou-se comum que pessoas não
pertencentes às dinastias governantes pudessem ter suas próprias cópias do
livro. Em dado momento até mesmo os artesãos as conseguiram.
Como eram todos desenhados, escritos e pintados
à mão, não é de admirar que custassem muito caro estando, portanto, apenas ao
alcance de uma alta elite, a possibilidade de aquisição de um exemplar
personalizado. Embora os preços pudessem variar, dificilmente estariam ao
alcance do camponês comum.
Já foram descobertos mais de 25 mil exemplares
do Livro dos Mortos, sendo que os mais antigas são datadas de 1500 a .C. aproximadamente.
No início, as obras completas englobavam cerca
de 200 estrofes em forma de encantos ou hinos, embora a maioria dos exemplares
variasse entre 40 e 50, pois o conteúdo de cada rolo de papiro era feito de
acordo com as escolhas (ou posses) do interessado ou de sua família. As
quantidades da obra completa variaram, contudo, ao longo do tempo, inclusive a
depender da região de seu uso:
Durante
o Período Saíta (c. 664 a .
C.) atinge a versão canônica sendo estruturada em 165 fórmulas ou capítulos
dispostos em uma ordem regular, conhecida como Recenção Saíta, que permaneceu
em uso até o Período Ptolomaico quando atinge a sua forma completa com 192
capítulos.
Esta
padronização das fórmulas e vinhetas (conteúdo e seqüencia) não significou uma
estagnação, surge o estilo mênfita e o tebano evidenciando uma ruptura entre o
Alto e Baixo Egito, onde circulavam versões diferentes para o mesmo capítulo e
vinheta.3
Considerado uma obra do deus Toth, o Livro dos
Mortos era um conjunto de fórmulas que a alma do morto deveria utilizar para
garantir sua absolvição e a entrada no Paraíso. O fracasso significava ter a
alma devorada por Ammut (um monstro com corpo misto de leão/hipopótamo e cabeça
de crocodilo), e jamais poder voltar à vida.
Diante de tamanho desafio, era de esperar que
os preocupados egípcios procurassem se preparar da melhor forma possível e
munir-se de todas as ferramentas disponíveis para enfrentar o momento decisivo
de sua existência!
Imagem:
http://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Judgement_of_Osiris?uselang=pt-br
1Os
Textos da Pirâmide de Unas, descobertos em 1881 por Gaston Maspero, são os
escritos religiosos mais antigos descobertos até hoje. Por apresentarem uma
síntese das crenças religiosas do Antigo Egito, eles datam de 4.500 anos ou
mais, considerando que estas crenças devem ter nascido muito antes de serem
transcritas na pedra.
Embora a Pirâmide de Unas seja a menor das
pirâmides reais construídas no Antigo Império, ela foi a primeira a trazer em
suas paredes internas este conjunto de encantamentos (fórmulas), que ajudariam
a alma do faraó em sua jornada para o próximo mundo.
Os textos estão gravados nas colunas, sobre as
paredes do corredor, da ante-câmara e da passagem que leva à câmara funerária
da pirâmide. As paredes que cercam o sarcófago não têm texto e o teto é coberto
por estrelas.
Os Textos da Pirâmide de Unas estão dispostos
na tumba do Oeste para o Leste, simbolizando a crença que o reino dos mortos
ficava no Ocidente - a maioria das necropoles estão dispostas na margem oeste
do Nilo - e o Sol, associado à Ressureição por reaparecer vivificado após o seu
trajeto noturno, ressurge sempre no Oriente.
Estes textos foram retomados pelos soberanos
seguintes e, posteriormente, pelas rainhas no fim do Antigo Império. Algumas
fórmulas foram utilizadas também nos Textos dos Sarcófagos.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Textos_das_Pir%C3%A2mides
2Textos
dos Sarcófagos é a designação moderna atribuída a textos de carácter funerário
produzidos na civilização do Antigo Egipto a partir do Primeiro Período
Intermediário, mas sobretudo durante o Império Médio.
Em resultado da desagregação do poder político
no final do Império Antigo e das alterações culturais produzidas, a hipótese de
gozar uma vida no Além deixou de estar reservada à realeza, alargando-se aos
funcionários e, progressivamente, a toda a população egípcia. Os Textos dos
Sarcófagos, dos quais se conhecem mais de mil fórmulas, visavam proteger o
defunto no Além e prover as suas necessidades. Foram inscritos na sua maioria
em escrita hieroglífica cursiva no interior das paredes internas de sarcófagos
de madeira rectangulares (o que explica a designação de "Textos dos
Sarcófagos"), embora também se conheçam inscrições realizadas em vasos
canópicos, estelas, paredes dos túmulos e papiros.
Os textos retomam e adaptam as fórmulas dos
Textos das Pirâmides, textos gravados no interior das pirâmides de reis da V,
VI, VII e VIII dinastias. Contudo, verificam-se algumas novidades como a
possibilidade do defunto assumir várias formas, bem como de regressar à terra
para visitar os seus entes queridos. Enquanto que os Textos das Pirâmides
apresentam a possibilidade do defunto se juntar ao deus solar Ré, os Textos dos
Sarcófagos favorecem a união com Osíris. Saliente-se ainda que o acesso a uma
vida no Além está sujeito a ter levado uma vida marcada pela prática de um
comportamento justo.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Textos_dos_Sarc%C3%B3fagos
3http://aumagic.blogspot.com.br/2012/03/o-livro-dos-mortos-do-egito-antigo.html
PREPARANDO A VIAGEM AO PARAÍSO – A
MUMIFICAÇÃO
O Faraó e os ricos egípcios passavam a vida
preparando-se para o pós vida. Os túmulos eram construídos e decorados segundo
os desejos do futuro morto. Os pobres não tinham essa opção, de modo que eram
enterrados, geralmente, perto dos ricos, na esperança de que fossem
beneficiados de alguma forma, pela alma endinheirada.
Para os egípcios, o espírito precisava manter
seu corpo terreno intacto para prosseguir na vida após a morte. O ser humano
seria composto de quatro partes:
...o
ba, uma espécie de alma; o ka, ou "duplo", réplica imaterial do
corpo; o khu, centelha do fogo divino; e o kat, ou seja, o corpo. Acreditando
numa vida após a morte, entendiam que esses quatro elementos precisavam ser
preservados depois do falecimento do indivíduo. O ba e o khu, sendo elementos
espirituais, precisavam apenas de orações. O corpo, por ser a moradia do ka,
tinha que ser preservado e protegido. Em conseqüência, o túmulo, casa do morto,
devia ser mantido intacto para todo o sempre e permitir-lhe uma vida agradável
e semelhante à existência terrena.1
O pior crime que poderia ser cometido a um
egípcio seria a danificação ou destruição de sua múmia, pois significava que
seu espírito ficaria sem sua casa material. Essa profanação ocorreu em diversos
casos, inclusive com a múmia que a Drª. Joann Fletcher suspeitava ser de
Nefertiti.
À esquerda a múmia danificada da suposta Nefertiti. No centro Seti I e, à direita, Ramsés II |
A importância dada à vida após a morte era
proporcional aos cuidados dispensados à mumificação dos mortos. Os maiores
museus do mundo possuem múmias em exibição. Ramsés II ,
o Grande, pode ser “encontrado em pessoa” no Museu do Cairo e seu pai, Seti I,
tem uma das múmias mais bem preservadas de todas.
O processo de mumificação pode ter se iniciado
por acaso nos tempos mais remotos da História egípcia. Os corpos sepultados na
areia do deserto ficavam ressecados antes de se decompor e a mumificação
cerimoniosa pode ter sido apenas uma forma de imitar e garantir tal resultado.
O falecido era assistido por um sacerdote
especialista. Este removia o cérebro do morto pelas narinas, fazendo uso de um
gancho. Os demais órgãos eram extraídos por um corte na virilha e guardados em
vasos chamados canópicos. O coração era mantido intacto em seu lugar e, se
retirado, era substituído por um amuleto em forma de escaravelho.
Vasos Canópicos |
Feita essa extração, o corpo era coberto com
natrão2 e
deixado para secar entre 40 e 70 dias, quando a substância salina ressecava o
corpo e eliminava as bactérias, impedindo a decomposição. Terminada a secagem e
desinfecção:
as
cavidades eram cheias com linho e substâncias aromáticas, e enrolava-se o corpo
com ligaduras. Os olhos eram cheios com linho ou pedras pintadas de branco.
Faraós e pessoas ricas eram estofados com tecidos virgens. Já os pobres eram
forrados com as roupas que haviam usado em vida, terra ou serragem. Depois
disso, a incisão era fechada com uma placa de ouro, para evitar a invasão do
corpo por maus espíritos. Durante cada uma dessas etapas da mumificação, eram
lidas preces do Livro dos Mortos, que ensinava como o ritual deveria ser feito.3
Instrumentos para retirada do cérebro: vaso de óleo, ganchos, faca do embalsamador e funil para o nariz. |
Materiais usados para mumificação: (1) linho. (2) serragem; (3) líquen. (4) cera de abelha. (5) resina. (6) natrão. (7) cebolas. (8) lama do Nilo. (9) almofadas de linho. (10) incenso. |
O processo de enfaixar o falecido começava
pelos pés ou mãos e durante a operação eram colocados amuletos junto ao corpo e
entre as faixas, contendo fórmulas para ajudar a caminhada.
O sepultamento era feito em procissão liderada
pelo sacerdote até a tumba. O corpo, já no sarcófago, era acompanhado pelos
vasos canópicos e por diversos pertences, dentre eles, a valiosa cópia do Livro
dos Mortos.
Quanto mais rico o falecido, mais sofisticado
seu túmulo. O Faraó Tutancâmon, por exemplo, teve quatro capelas funerárias,
encaixadas umas nas outras, dentro delas um sarcófago e, dentro deste, três
caixões, um dentro do outro.
Na imagem superior esquerda os objetos encontrados na tumba de Tutancamon. À direita a capela funerária. Na imagem inferior esquerda os sarcófagos e, à direita, o esquema de encaixamento. |
Em sua companhia, mais de 5000 objetos
destinados a oferecer-lhe todo o conforto na vida após a morte. Considerando-se
a inexpressividade e o curto período de seu reinado, não podemos nem imaginar
que riquezas não compuseram as tumbas de Faraós mais famosos, como Ramsés II,
por exemplo.
NO TRIBUNAL DE OSÍRIS
O Livro dos Mortos possui esse nome por conta
dos historiadores. Os egípcios, porém, o chamavam de “Capítulos do Sair à
Luz ou Fórmulas para Voltar à Luz (Reu nu pert em hru)”1,
e isso significava vencer os desafios e armadilhas que estavam colocadas em seu
caminho na vida após a morte.
Testemunha da História do Egito, o livro
apresentou variações ao longo dos séculos. Capítulos entraram ou saíram de sua
composição de acordo com as variações culturais das épocas e a qualidade de sua
feitura revela os tempos de crise ou bonança da terra dos Faraós.
Os períodos do auge das dinastias nos legaram
as cópias feitas com maior esmero e beleza, enquanto os períodos de transição
ou agitação social mostram-se em cópias mal feitas ou de qualidade inferior.
A caminhada, porém, era uma só e o julgamento
no Tribunal de Osíris era o ponto culminante dela. Ao chegar para seu
julgamento, a alma do morto é conduzida ao salão pela deusa Maat, da
Justiça.
A Balança de Anúbis. À esquerda o coração e, á direita, a pena da Verdade. |
Nele já estão presentes os deuses Hórus e
Osíris, este último em seu trono, portando os símbolos de seu poder, o cetro e
o leque. Ele está em companhia de Ísis e Néftis, suas irmãs, posicionadas atrás
do trono.
O deus Toth (direita), perante Osíris em seu trono (roupa vermelha) com uma de suas irmãs atrás (esquerda). |
O júri, se é que podemos chamar assim, pois nos
parece que sua deliberação é apenas confirmar o resultado já dado pela balança
de Anúbis, é composto por 42 juízes, um para cada província do Egito, e também
está presente.
Os Juízes, representando as províncias do Egito. |
No meio do salão está a balança onde o coração
da alma será pesado em comparação à pena da verdade, uma pena de avestruz. O
resultado esperado deve ser um empate. O deus Anúbis (cabeça de chacal) faz a
pesagem que é anotada por Toth (cabeça de ibis) em um papiro.
A pesagem também é assistida pelo esfomeado
Ammut, um monstro com cabeça de crocodilo e um corpo que é parte leão, ou
outros felinos, e hipopótamo. Suas refeições são garantidas por aqueles cuja
balança de Anúbis revelam um coração mais pesado que a pena da verdade.
|
Antes da pesagem, porém, a alma deve, perante
os juízes, declarar que não cometeu um certo número de pecados. Essa declaração
negativa traz grande semelhança com os Dez Mandamentos da Bíblia, e será tema
de texto posterior.
Feita a declaração, o coração da alma é, então,
pesado e, em caso de aprovação, Hórus conduzirá a alma até diante de Osíris,
que vai lhe indicar seu destino no Além. O ideal de Paraíso egípcio é
representado por um campo de juncos, o que significa um oásis.
Hórus apresenta a alma aprovada a Osíris. Atrás dele as irmãs Ísis e Néftis. |
Não se tem notícia de algum momento anterior na
História escrita em que alguma outra civilização tenha demonstrado a
preocupação com o julgamento das almas de seus mortos a partir de um código
escrito de conduta ética. O Livro dos Mortos é o indício histórico que coloca
os egípcios à frente na corrida rumo ao Campo dos Juncos!
O escriba Nebqed, na companhia de sua esposa Meryt, e sua mãe Amenemheb, apresentam-se, aprovados, a Osíris. No centro a mesa de oferendas. |
Imagens:
http://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Judgement_of_Osiris?uselang=pt-br
http://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Book_of_the_Dead?uselang=pt-br#mediaviewer/File:Egypt_bookofthedead.jpg
1http://www.tolledo.net/artigoV2/114/O_Livro_dos_Mortos_do_Antigo_Egito.htmlBaixe o Papiro de Ani completo para sua coleção de imagens. Clique na imagem acima e faça o download. |
O PAPIRO DE ANI
Ernest Alfred Thompson Wallis Budge, inglês,
nascido na Cornualha em 27/07/1857 e falecido em 23/11/1934, foi, na visão de
alguns, um dos maiores responsáveis pelo fascínio que a História do Egito
desperta ao longo dos tempos. Na visão de outros foi um dos maiores ladrões de
artefatos egípcios dos mesmos tempos!
Diretor de antiguidades egípcias e asiáticas do
Museu Britânico, escritor de mais de 100 livros, alguns com erros depois
descobertos, parece-nos que ele não media esforços e meios, escusos ou não,
para obter todos os artefatos antigos valiosos nos quais pudesse colocar as
mãos, segundo se pode perceber das informações trazidas no documentário O Livro
dos Mortos, do History Channel, produzido por Tim Evans e dirigido por Petra
Hafner.
"Arqueólogos" do Século XIX estudando uma múmia. |
No mesmo documentário, Stuart Tyson Smith, Phd,
Professor da Univeristy of California Santa Barbara diz que “Ele
praticamente pilhava e saqueava, comprando o que via...”. Já James
Wasserman, escritor e ocultista, contemporiza dizendo que “As pessoas fazem
julgamentos totalmente extemporâneos. Comprar objetos culturais naquele tempo
era normal.”
Esta é a mesma linha de pensamento de Carol A.
R. Andrews, autora de vários livros sobre o Egito. No documentário ela declarou
que “Não devemos olhá-lo como mero ladrão de culturas. Não se pensava assim...”,
o que difere um pouco do pensamento de Zahi Hawass, à época do documentário
Chefe do Conselho Supremo de Antiguidades: “Para mim era ladrão...”
À esquerda Wallis Budge. À direita Zahi Hawass. |
Contudo, ladrão ou egiptólogo proeminente, ou
mesmo um pouco de cada, foi Wallis Budge o responsável por resgatar, levar para
Inglaterra e traduzir um dos melhores exemplares do Livro dos Mortos de que se
tem notícia: o Papiro de Ani.
Ani era escriba, uma espécie de contador do
Templo de Osíris, que viveu, provavelmente, durante o reinado de Seti I ou de
seu filho, Ramsés II. Vivendo em Tebas e convivendo diretamente com o cotidiano
de um dos pólos centrais da religião, Ani preocupava-se ainda mais com a vida
após a morte.
O funeral de Ani. Ao centro as mulheres choram a perda. |
O Ba (alma) sobre o Kat (corpo) mumificado de Ani. |
É de se imaginar que seus contatos estreitos
com os sacerdotes lhe rendiam informações privilegiadas sobre todos os aspectos
da vida espiritual conforme a entendiam os religiosos de seu tempo. A elevada
posição social de que era detentor como escriba, aliada à sua função de
recebedor das doações e tributos pagos ao templo, lhe garantiu recursos
suficientes para encomendar um dos mais bem feitos e completos exemplares do
Livro dos Mortos já encontrado.
Wallis Budge o comprou ainda com o selo intacto
e, ao abri-lo, deparou-se com 24
metros de magníficas ilustrações coloridas e escrita
excelente. O Papiro de Ani possui 65 orações e encantamentos e cerca de 150
ilustrações coloridas.
No centro da imagem, Anúbis protege a múmia de Ani. |
Logo, porém, o achado lhe foi tomado por ordem
do diretor do Departamento de Antiguidades Egípcias da época, o francês
Eugène Grébaut, que apreendeu diversos artefatos e os trancou sob guarda.
Segundo o documentário do History dá a
entender, Wallis Budge teria pago a um dono de hotel vizinho ao depósito para
escavar um túnel até o quarto onde os objetos estavam e roubá-los. Para que a
operação não fosse ouvida pelos guardas ele providenciou uma refeição
“batizada” que os fez dormir pesadamente!
Wallis Budge acreditava que o papiro se
perderia se fosse levado ao museu do Cairo. Assim, quando chegou ao Museu
Britânico, com o intuito de preservar e estudar o precioso artefato, Wallis
Budge tomou a providencial atitude de... cortá-lo em pedaços!
...
Nesta parte do livro Ani, ou seus "clones", trabalha para os deuses. |
O Capítulo 125 - Ani faz as Confissões Negativas, afirmando não ter cometido uma série de pecados. |
Bem... agora que já conseguimos parar de
esmurrar a mesa e esmagar os papéis, voltemos ao papiro...
Anúbis pesa o coração de Ani contra a Pena da Verdade de Maat, deusa da Justiça. Toth anota o resultado observado por Ammut, sempre pronto a devorar os reprovados. |
Não se sabe como ou quando Ani morreu, mas sua
caríssima aquisição foi com ele para o túmulo e, supostamente, o ajudou a fazer
a caminhada no Além rumo ao Campo dos Juncos.
Hórus conduz Ani (que se ajoelha) perante Osíris e suas irmãs, Isis e Néftis.
|
Ani, e sua esposa Tutu, apresentam uma mesa de oferendas a Hórus.
|
Sua cópia personalizada do Livro dos Mortos
apresenta ilustrações de sua alma fazendo todo o percurso previsto, enfrentando
os desafios e respondendo as questões com a ajuda das orientações do livro.
Ani parece ter vencido a tortuosa estrada rumo
ao Campo dos Juncos!
Imagens:
http://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Papyrus_of_Ani?uselang=pt-br
http://www.clccharter.org/euzine1/mummificationwebsite.html
http://elainn.deviantart.com/art/Mummification-3-292789386
http://hiddenchronicles.wikia.com/wiki/Mummification_Room?file=Scene_Mummification_Room-Screenshot.png
https://mcs-ancientcivs-2011.wikispaces.com/RA+Death+and+the+Afterlife+Mummification+Process
http://i-cias.com/e.o/mummy.htm
http://veehd.com/video/4556542_Digging-For-The-Truth-Nefertiti-The-Mummy-Returns
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Seti_I_memmy_head.png
http://www.prairiesmokepress.com/tutankhamuns-treasures-come-to-malmo/
http://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Sarcophagi_of_Tutankhamun?uselang=pt
http://deadandwrapped.tumblr.com/
1http://www.geocities.ws/lumini_enigmas/LUMINI_ENIGMAS_E_MISTERIOS_ARQUIVOS/Crencas_Funerarias.html
2Natrão
é um mineral composto por carbonato de sódio hidratado, com fórmula química
Na2CO3·10H2O.
O natrão era uma das substâncias utilizadas pelos
antigos egípcios nos processos de mumificação; na verdade o natrão era composto
por carbonato de sódio, bicarbonato de sódio, sal e sulfato de sódio - no qual
as múmias ficavam imersas por durante 70 dias; a substância natural era
encontrada em várias regiões do país, especialmente no uádi el-Natrum. Seu uso,
neste fim, destinava-se à desidratação das células e combate às bactérias.
Na antiguidade egípcia seu uso também era o de
alvejante para roupas brancas, e misturado com argila formava um tipo de sabão,
com uso no preparo da lã.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Natr%C3%A3o
3http://www.geocities.ws/lumini_enigmas/LUMINI_ENIGMAS_E_MISTERIOS_ARQUIVOS/Crencas_Funerarias.html
AS CONFISSÕES NEGATIVAS E OS DEZ MANDAMENTOS
As 42 confissões negativas do Livro dos Mortos, apesar das
variações, talvez fruto das traduções, constituem o código de conduta, os
princípios éticos e morais sob os quais se sustentava a sociedade egípcia.
É uma impressionante coleção de comportamentos corretos que a
pessoa deveria observar em vida, considerando futura cobrança pelos deuses após
a morte.
O fato de que o Livro dos Mortos ensina como passar pelos
desafios, oferecendo fórmulas e indicando amuletos, revelando que os egípcios
não eram exatamente fiéis em vida, isso não exclui a conclusão de que aquele
povo tinha princípios éticos e morais que considerava relevantes para atingir o
Paraíso.
É justamente neste ponto que o Livro dos Mortos se encontra com os
Dez Mandamentos de tal forma que alguns estudiosos chegam a sugerir que Moisés
teria se inspirado nele para compor seu código de conduta. Retiram de Deus a
autoria, o que consideramos um erro e aqui está escrevendo um autor cristão que
não vai se separar de sua convicção.
Nós, enquanto cristão, consideramos que, como as Leis de Deus são
perfeitas, e portanto imutáveis, qualquer código de boas práticas encontrará
respaldo nestas Leis e terá muitas semelhanças com outros códigos semelhantes,
guardando apenas pequenas diferenças de núcleo cultural e temporal.
Primeiro vamos separar os Mandamentos que possuem equivalentes
egípcios e, depois, veremos o que sobra, se haveria, de fato, muita diferença.
Acima, sem numeração e em negrito, vai o Mandamento e, abaixo, numeradas, as
confissões, na ordem do Papiro de Ani:
Não usar o nome de Deus em vão;
27 Eu não blasfemei.
37 Eu não amaldiçoei Deus.
|
Não roubar;
Não cobiçar o que é do outro.
02 Eu não cometi roubo com violência.
03 Eu não roubei.
05 Eu não roubei grãos.
06 Eu não furtei oferendas.
07 Eu não roubei a propriedade de deus.
16 Eu não roubei terra cultivada.
39 Eu não tenho roubado o pão dos deuses.
40 Não desviei bolos khenfu dos espíritos dos mortos.
41 Eu não arranquei o pão de crianças nem tratei com
desprezo o deus da minha cidade.
42 Eu não matei o gado que pertence ao deus.
|
Não matarás;
04 Eu não matei homens e mulheres.
14 Eu não ataquei qualquer homem.
28 Eu não sou violento.
|
Não levantar falso testemunho;
08 Eu não proferi mentiras.
15 Eu não sou homem falso.
18 Eu não caluniei.
20 Eu não desmoralizei verbalmente a mulher de homem
algum.
|
Não cometer adultério;
Não desejar a mulher do próximo.
11 Eu não cometi adultério, não deitei com homens.
|
Nossa comparação pode ser contestada por uma observação mais
rigorosa, no entanto, estamos buscando apenas a essência, o conceito que
aproxima as duas filosofias.
Assim, para nós, a blasfêmia e a maldição proferidas contra a
divindade podem ser encaixadas como transgressão ao “Não usar o nome de Deus em
vão”, assim como a violência pode estar junto ao “Não Matarás”, considerando
que o assassínio dificilmente prescindirá de alguma forma de violência.
Da mesma forma, embora a mulher do próximo não seja
necessariamente sua esposa, não haverá adultério se não houver, antes, o
desejar da esposa alheia.
Quanto ao “Não Roubarás”, todas as confissões negam algum tipo de
subtração de propriedade de outrem, sejam eles deuses, espíritos ou homens e
não há, a nosso ver, a possibilidade de que alguém vá roubar algo que, de
alguma forma não tenha cobiçado antes.
Na mesma linha, mentir, ser falso, caluniar e desmoralizar,
certamente se encaixam na categoria de falso testemunho.
Vemos, portanto, que sete (70%) dos Dez Mandamentos possuem alguma
relação com as Confissões Negativas do Papiro de Ani. São nada menos que 20
confissões (quase 50%) relacionadas de alguma forma a um equivalente hebreu.
Indo além, considerando que a semelhança é irrefutável, também
fica claro que o código de conduta egípcio é bem mais detalhado e específico,
embora a simplicidade Divina dos Dez Mandamentos tenha o dom de torná-los muito
mais abrangentes.
Os Mandamentos restantes (Amar a Deus sobre todas as coisas / Santificar
o dia de descanso / Honrar pai e mãe) também não ficam descartados quando
sabemos do cuidado egípcio com a religiosidade e com seus antepassados. É
provável que isso fosse tão óbvio que nem precisaria ser incluído nas
confissões.
Vejamos, agora, as confissões restantes:
01 Eu não cometi pecado.
09 Eu não joguei comida fora
10 Eu não proferi maldições
12 Eu não fiz ninguém lamentar
13 Eu não comi o coração.
17 Eu não fui um intrometido.
19 Eu não senti raiva sem justa causa.
22 Eu não me profanei
23 Eu não aterrorizei ninguém
24 Eu não transgredi a lei
25 Eu não fui irado
26 Não fechei os ouvidos às palavras verdadeiras.
29 Eu não fui um agitador de conflitos.
30 Eu não agi com pressa imprópria.
31 Eu não pressionei em debates.
32 Eu não falei demais
33 Não prejudiquei ninguém, não fiz nenhum mal
34 Não fiz feitiços nem blasfêmias contra o Faraó
35 Eu não interrompi o fluxo de água
36 Eu nunca elevei minha voz.
38 Eu não agi com arrogância.
|
Vemos que as confissões restantes apenas aprofundam e especificam
mais as anteriores, como se fossem, a nosso ver, gradações mais leves, mas que
podem levar aos degraus maiores, que relacionamos aos Dez Mandamentos.
Também vemos que demonstram o comportamento egípcio em comunidade,
nos permitindo perceber que aquela sociedade considerava incorreta a alteração
de comportamento, a perda do equilíbrio interior e abominavam o desperdício.
Por fim, o status quo também ficava garantido
pois, atentar contra o Faraó, ainda que apenas em palavras, era um pecado!
[1] O PAPIRO DE ANI - O LIVRO
EGÍPCIO DOS MORTOS - Traduzido por E.A. Wallis Budge. Disp.:http://www.historia.seed.pr.gov.br/arquivos/File/fontes20historicas/livro_egipcio_dos_mortos.pdf
[2] http://guarda-livro.blogspot.com.br/2014/06/42-confissoes-negativas-para-maat.html
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I had to translate the page but after doing so I was fixated! The information about the religious lifestyles of the ancient Egyptians is superb. I found the artwork displayed in the book of the dead (or Reu nu pert em hru as they called it) particularly fascinating!
ResponderExcluirThank you very much! You're so kind! Feel yourself always welcome here in Reino de Clio (Kingdom of Clio - the muse of History)
ExcluirObrigado pelo texto. Muito bom..
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