O TECER
DE PENÉLOPE – A VISÃO DE JOÃO PINTO FURTADO - Cont...
Furtado nos
esclarece que no século XVIII ocorreram inúmeros conflitos, onde se
percebe que diferentes interesses, percepções e tentativas de
apropriação política do espaço sócio-econômico das Minas
Gerais, estiveram no centro dos acontecimentos.
E que o
movimento de Inconfidência Mineira foi marcado com traços bastante
heterogêneos, onde estavam em jogo não somente as questões mais
gerais, uma emancipação de Portugal, mas também interesses
individuais dos mais variados possíveis.
No capítulo
intitulado “Monumentos”, o autor discute as formas simbólicas do
movimento em diferentes épocas. Mostrando como as “imagens”
moldam um discurso em determinadas fases da historiografia
brasileira, para Furtado, “mais do que simples fatos históricos,
portanto, o evento em questão transformou-se em importante
ferramenta simbólica para pensar algumas questões em diferentes
situações mais contemporâneas”. (p.32)
Na primeira
metade do século XIX, anos 20 e 30, observa-se uma apropriação e
exaltação da Inconfidência Mineira como uma tentativa de
libertação nacional, como se constituísse em um “pré-Ipiranga”.
A partir da
década de 1870, o evento ganha novo formato, uma inspiração
republicana original, transformando Tiradentes e a Inconfidência
Mineira em modelo pedagógico e formador do cidadão por excelência.
Na
Revolução de 1930, sobretudo no discurso, notadamente das elites
urbanas, percebe-se o resgate da proposta industrializante dos
inconfidentes e Tiradentes é colocado como precursor da luta
anti-oligárquica. No período populista, a Inconfidência simboliza
a conciliação entre a modernidade e a ordem.
Já nos
precedentes do golpe de 1964, alguns políticos mineiros se
auto-intitulavam “novos inconfidentes”. São essas, segundo o
autor, as principais apropriações simbólicas, no campo político,
do movimento de 1788-9.
Na esfera
cultural o autor analisa a contribuição da obra cinematográfica Os
Inconfidentes, de 1972, do diretor Joaquim Pedro de Andrade.
Segundo Furtado:
O filme é
uma sofisticação de linguagem, precisão técnica e certo pendor
crítico quanto a ação dos intelectuais na conjuntura dos anos de
1970, além de alguma ironia e sarcasmo quanto a apropriação
anacrônica do tema da Inconfidência Mineira. (p.33)
Outra
contribuição na discussão acerca da apropriação simbólica da
imagem de Tiradentes é colocada por Sérgio Buarque de Holanda, na
qual Furtado faz referência.
O
historiador levanta questionamentos acerca do aspecto representativo
da aparência do inconfidente, mostrando o aspecto físico de um
agente histórico e seu tratamento pela memória. Segundo Furtado,
“ele não renega ou desqualifica o trabalho da memória, utiliza
este como ponto de partida e ir mais além”. (p. 39)
Com o
sub-tópico “Inconfidências dos Inconfidentes”, Furtado
questiona a historiografia regional mineira, que mostra de forma
quase romântica os membros do levante de 1788-9, principalmente a
figura de Tiradentes, colocado como herói, sem apontar os
“defeitos”, entre os quais estão incluídas práticas nada
cristãs.
Segundo
Furtado, o objetivo “é tentar mostrar uma face menos conhecida
dos inconfidentes [...] homens e atos que fundaram nossa
nacionalidade”. (p.40)
Continua...
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7FURTADO,
João P. O
manto de Penélope; História, mito e memória da
Inconfidência Mineira de 1788-9.
(1ª ed.) São Paulo: Cia das Letras, 2002
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