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sábado, 25 de abril de 2015

XINGU TERRA MAGICA


RESENHA

XINGÚ: TERRA MÁGICA” – UM MANUAL DE ANTROPOLOGIA

Por Marcello Eduardo

O documentário “Xingú: Terra Mágica”, realizado pelo Jornalista Washington Novaes em 1985 e exibido pela extinta tv Manchete, pode ser considerado um manual de Antropologia em vídeo por excelência. Ao assistir as imagens não há como não ver as abordagens da obra de Aracy Lopes da Silva (1988), Roque de Barros Laraia (2001) em suas definições de cultura e Alcida Ramos (1995) seguida ou representada.  

Vemos que a terra é de posse coletiva, é sagrada e está ligada às origens ancestrais, pois é nela que estão enterrados os antepassados e onde encontram-se todas as referências que compõe a identidade cultural do grupo. É à terra que estão ligados os mitos criadores, as divindades e cada uma de suas dádivas, que não são propriedades do índio, mas pertencentes a um espírito que pode estar satisfeito ou ficar bravo, trazendo problemas. 

Na obra de Ramos vamos ver, e com a ilustração do documentário, que os recursos são explorados, trabalhados e distribuídos de forma coletiva e que os aspectos culturais e religiosos não são atividades à parte, mas integram o cotidiano, pois o índio, e na área cultural do Xingú não será diferente, é um ser social em todos os momentos. O que vai encontrar paralelo também em Aracy Lopes da Silva que mostra ainda a divisão sexual do trabalho, que é através deste que os frutos da terra serão apropriados e a existência de obrigações recíprocas e a retribuição.

       Assim, voltando a Ramos, a dor da esposa será compartilhada pelo marido, um nascimento mobilizará toda aldeia, cada auxílio deverá receber, invariavelmente reciprocidade, e as crianças farão suas brincadeiras como adultos em miniatura, buscando um aprendizado vital. 

Aqui não haverá como não recorrer à confirmação de SILVA de que “A vida das crianças acontece num cenário de verdade. De verdade, sim, mas em miniatura (...) Cozinham mesmo, caçam mesmo, coletam mesmo...” (1988. p.24), de que é participando das atividades dos adultos, imitando-os, que as crianças aprendem a viver.

Também poderemos ver ilustrado o pensamento de Laraia de que será necessário um conhecimento do sistema cultural mínimo por parte do indivíduo para que saiba operar dentro deste. (LARAIA, 2006, p.86)

Ainda em Ramos podemos verificar que é também a reciprocidade que auxilia o controle social e a manutenção da ordem, pois com a ausência de um poder de coerção direta na pessoa do líder, será sua experiência e generosidade que lhe garantirão o status e a obrigação moral da justa medida e recompensa, garantirá o equilíbrio necessário à sobrevivência do grupo como um todo.

E, se antes das leituras, causaria estranheza ver os índios usando instrumentos tipicos dos brancos, ao ler Silva vamos perceber que não se pode esperar mesmo que os índios permanecessem com o mesmo comportamento da época do descobrimento, pois estas culturas “nunca estiveram paradas no tempo”, (SILVA, XXXX) que são dinâmicas, se transformam, interagem, permutam experiências nos contatos com outras culturas.

O documentário nos leva, ainda, a pensar a cultura indígena da forma correta, observando, quase vivenciando, vendo as atitudes dos indígenas do ponto de vista deles, não do nosso. E é exatamente isso o mais interessante, pois esta observação nos leva a uma compreensão da nossa própria cultura, pelo que tem de diferente mas, pasmem, pelas semelhanças, que não são maiores apenas pelo que parece ser uma questão de referenciais.

É extraordinário notar que os índios vão possuir problemas conjugais de ciúmes, preocupações redobradas com suas filhas adolescentes, rituais de passagem para a idade adulta, questões políticas, religião baseada numa figura sacerdotal, superstições, explicações míticas para fenômenos naturais, crença no sobrenatural. Não haverão muitas sociedades hoje, se é que existe alguma, totalmente livres destas características.

E daí a pergunta: não estão certos os antropólogos ao pregar o respeito à cultura e o livre arbítrio dos povos? O documentário “Xingú: Terra Mágica”, do Jornalista Washington Novaes já nos dizia, em 1985, que sim.



REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO



LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar, 2006.



RAMOS, Alcida Rita. Sociedades indígenas. São Paulo: Ática, 1996.



SILVA, Aracy Lopes da. Índios. São Paulo: Ática, 1988.



NOVAES, Washington. Xingú: Terra Mágica. São Paulo: TV Manchete, 1985,

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